Foi tensa a sessão da CPI do Guincho, presidida pelo deputado Enivaldo dos Anjos (PSD), nesta segunda-feira (25), na Assembleia Legislativa do Espírito Santo. Num dado momento, o parlamentar passou a presidência para o deputado Marcelo Santos (PMDB) e foi ao encontro de um grupo de guardas municipais de Vitória, que estavam em frente à entrada do Plenário Judith Leão, exigindo que eles fossem desarmados.
“Estão aqui com essa atitude para intimidar as pessoas que vêm depor para denunciar os abusos que essa quadrilha anda cometendo em Vitória. Ninguém pode entrar armado na Assembleia”, ordenou o deputado, pedindo a intervenção do tenente-coronel Carlos Nei, que acompanha a CPI representando o comando da Polícia Militar, para identificar e desarmar os guardas civis.
No plenário, duas pessoas prestavam depoimento denunciando terem sido vítimas de ações arbitrárias dos agentes de trânsito da Guarda Municipal de Vitória, a advogada Naiara Guimarães e a morada da Praia do Suá Marlene dos Santos Cândido, que teve seu carro rebocado de madrugada, em frente à sua casa, numa rua que não tem proibição de estacionamento.
Quebra de sigilo
A CPI dos Guinchos da Assembleia Legislativa vai entrar na Justiça para obter a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico de cinco agentes de trânsito do município de Vitória, que são os campeões de autuações e de chamadas de guincho na capital, conforme relação divulgada nesta segunda-feira (25) pelo secretário municipal de Segurança Urbana, coronel Frônzio Calheiro Motta, durante seu depoimento.
Os agentes conhecidos como Vitor, Bertolo, Escobar, Vilmes e Henrique, além do presidente do Sindicato dos Guardas e Agentes de Trânsito do Espírito Santo, Eduardo Dias Amorim, também serão convocados pela Comissão Parlamentar de Inquérito para prestar depoimento na próxima segunda-feira, dia 1º de junho, às 11 horas.
O prefeito Luciano Rezende não atendeu ao convite da CPI para depor. Saiu de licença pela manhã da Prefeitura e mandou uma correspondência para os deputados dizendo que toda e qualquer informação, devido à “desconcentração administrativa”, seria fornecida pelo secretário de Segurança, a quem está submetida a Guarda Municipal, que tem estado no centro das denúncias de abuso de autoridade por usuários de vias públicas da Capital.
O presidente da CPI, deputado Enivaldo dos Anjos (PSD), não gostou da posição do prefeito: “É lamentável que o prefeito da cidade não dê uma satisfação à população. E não tem nada a ver com desconcentração administrativa, porque ele foi, devidamente, convidado para estar aqui”.
Ao final da sessão, que ouviu depoimentos de proprietários de veículos que se disseram “vítimas desse guincho” e do secretário Frônzio, o parlamentar foi ainda mais duro: “A preocupação é que o secretário veio aqui defender um sistema que todo mundo condena. Temos relatos de exageros e abusos dessa quadrilha, que está roubando a população de Vitória sem nenhum diálogo. A legislação prevê o guincho como a pena máxima, mas em Vitória guinchar os veículos é a pena imediata quando as pessoas não recolhem a taxa nos parquímetros do rotativo. E digo que é uma quadrilha porque ficou claro que esse sistema está influenciando o governo municipal, um joga a culpa no outro. O município está entregue a essa máfia do guincho”.
Para o deputado Enivaldo dos Anjos, a Comissão Parlamentar de Inquérito quer que o serviço de guincho seja suspenso até que as coisas se esclareçam: “A culpa de continuarem guinchando é do governador do Estado e do prefeito de Vitória. Está nas mãos deles acabar com essa quadrilha. Há suspeitas de pagamento de propinas pelos guinchos aos guardas e de propinas da empresa de parquímetro para alguém da administração. São grupos com interesses financeiros, que estão extorquindo a população, com a conivência do prefeito Luciano Rezende”.
Além do secretário de Segurança de Vitória, a CPI mostrou um vídeo com parte da denúncia do Padre Edson Alexandre dos Santos, que teve o carro guinchado na rua Fortunado Ramos na semana passada, bem como da advogada Naiara Guimarães Campos Lirio e de Marlene dos Santos Cândido, que teve o carro guinchado pela Polícia de Trânsito, às 5h30, em frente à sua casa no dia 28 de julho de 2013, numa rua sem placas de proibição de estacionamento, na Praia do Suá.
A advogada Naiara Guimarães teve o carro multado e guinchado apenas 15 minutos depois de vencer o prazo que pagou no parquímetro durante uma consulta médica. Ela questionou a legalidade do guinchamento por falta de pagamento do estacionamento rotativo. “Argumentei com os guardas mas eles não quiseram conversa.
A lei prevê notificação administrativa e, somente depois do não recolhimento, é que vem a multa. Não falta em guincho. “Em nenhum lugar do rotativo e nem nos vídeos de divulgação quando da implantação do parquímetro fala no risco de guincho pelo não pagamento, mas sim em penalidade administrativa”, disse a advogada. O secretário de Segurança começou seu depoimento dizendo que a população foi a favor da implantação do rotativo, mas foi interrompido pelo presidente da CPI: “Se fosse tão bom assim o prefeito teria vindo aqui dar uma satisfação”.
Fronzio Calheiros disse que uma Portaria da última semana estabelece que o acionamento do guincho não pode mais ser feito pelos agentes de trânsito, mas somente pelos chefes de equipes.
A atuação da Guarda Municipal está dividida em quatro áreas na capital, cada uma com um chefe e os guardas são sempre os mesmos nessas regiões. “Estão entregando o galinheiro para a raposa”, reagiu o deputado Enivaldo dos Anjos. “A prefeitura está prestando serviço a uma quadrilha e o que a CPI quer é que se acabe com esse constrangimento”.
A relatora, deputada Janete Sá, acrescentou questionando ao secretário se ele admitia que a situação havia fugido ao controle da administração e Fronzio admitiu que há situações a corrigir no sistema e disse que foi aberta sindicância para apurar abusos dos guardas vinculados a reivindicação trabalhista, conforme denunciado na última semana.
O deputado Enivaldo do Anjos questionou o secretário se ele tem informações de que guardas receberiam propinas dos guinchos a cada carro removido e o promotor Fábio Langa Dias, que acompanha os trabalhos representando o Ministério Público Estadual, reforçou as denúncias feitas em 2008 com relação a agentes estaduais de trânsito.
“Esse fato está suficiente demonstrado nos autos”, disse Fábio, que se disse “estarrecido com tudo o que estava ouvindo naquele momento, inclusive de que não há previsão em lei para guinchar os carros”. Uma cópia da denúncia do MP foi entregue ao secretário municipal, que o tempo inteiro sustentou a previsão do guincho em lei com base no Artigo 131 do Código de Trânsito Brasileiro, mas foi muito questionado pelos deputados pelo fato de Vila Velha, utilizando a mesma legislação, adotar interpretação completamente diferente, notificando administrativa donos de carros que estacionam no rotativo e, por ventura, deixam de pagar os valores previstos no parquímetro.
A deputada Janete Sá, relatora da Comissão, demonstrou as discrepâncias com números das duas cidades, cidade que Vila Velha, que tem uma população maior do que Vitória e implantou o parquímetro antes, fez 1.383 notificações em 2014, “sem guincho”, e que Vitória, no mesmo ano, lavrou 3.510 autos de infração, “com guincho”. “Há um descontrole”, disse a parlamentar.